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Não sou Cinderela: relacionamento amoroso com gringo

Quando iniciei meu relacionamento com meu marido que é norte-americano, sabia que eu iria vivenciar diversas formas de preconceito, fossem elas em nossas famílias ou por meio de pesssoas cuja a opinião nós não daríamos a mínima importância. Definitivamente, a opinião alheia não é nem será um item na balança referente às minhas decisões, mas minha intenção é problematizar.

Sou preta, latina, vivi durante muitos anos no subúrbio do Rio e cresci em Santa Cruz, na Zona Oeste do Rio. Em muitos discursos de pessoas que eu sequer solicitei a opinião, meu relacionamento com Joel significava ganhar na loteria. Considero perda de tempo rebater certos discursos, mas minha intenção é apenas problematizar.

Sempre gostei de viajar… Conheci vários países e lugares do país antes de conhecer meu marido. Mas o discurso machista prevê sem que digamos uma palavra que eu comecei minha trajetória pelos roteiros depois de tê-lo conhecido.

Sou funcionária pública, professora. Minha categoria enfrenta sim diversos problemas, mas eu gosto do meu trabalho. Gosto de ter um trabalho também, porque gosto de ter dinheiro sim. Mas o discurso machista prevê sem que digamos uma palavra que eu vi nisto uma oportunidade de largar meus empregos e viver uma vida de madame nos “states”. Observação importante: não deixei meus empregos.

“Você ainda trabalha?” Pasmem, eu escuto isso com muita frequência.

“Se fosse eu, iria morar lá”. Beleza, mas isso não se trata de você. Certamente, o que mais me chocava no discurso machista, é que, as pessoas sem sequer conhecê-lo diziam este tipo de frase, inclusive no início do nosso relacionamento. Eu pensava para mim mesma “Ninguém cogita a hipótese de que ele seja um psicopata, porque é gringo”. Mas minha mente hoje vai além: ninguém cogitava esta hipótese porque ele é gringo e branco. Observação importante: eu ainda escuto esta frase.

E as perguntas sobre cidadania americana são bastante cansativas. Muita gente acha que ter cidadania americana é o máximo sem saber para que ela serviria. Eu não sei responder estas perguntas e nem me interesso em aprender. Não quero ter cidadania americana. Uma mente colonizada pensaria: “Isto é possível?”.

O discurso machista ainda me choca, porque por mais que eu não conte detalhes do meu relacionamento com Joel, muitas pessoas acham que podem opinar nisto. Por que? Penso eu que todo mundo acha que tem poder de opinião na vida de uma mulher.

Temos um cenário político catastrófico neste momento, mas eu gosto de viver no Brasil. Por mais que o discurso do colonizado pregue que tudo que é bom vem de fora, na contramão do sistema meu marido ama nosso país também. Gosto de ir à praia, fazer piadas com meus amigos, ver os papagaios voando por aí, gosto de escrever artigos e pesquisar sobre Educação Especial (chocaria os pregadores do discurso machista que eu goste de pensar?!?)…

Alguns podem até achar chocante, mas é perfeitamente possível conhecer alguém que vive em outro país de maneira natural e estabelecer um relacionamento, sem sonhar ter uma história estilo Cinderela. Quando Joel me conheceu, eu não fazia o papel de mulher que está ali sonhando com um homem que a tire de sua vida de infortúnios. Talvez esta tenha sido uma das razões de termos estabelecido uma forte relação.

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Em nosso 4º aniversário de casamento

Não estou aqui para criticar aquelas que fizeram escolhas diferentes das minhas; esta não é a minha intenção. Só quero problematizar. Pense e repense seu discurso.



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Brasileira e carioca. Residente no Rio de Janeiro. Formada em Pedagogia, atua como professora, mais especificamente na área de Educação Especial. Casada, além disso vive com um cachorro com uma inteligência assustadora. Ama dançar. Mochileira assumida com paixão por botar o pé na estrada.